terça-feira, 10 de abril de 2018

E o PT perdeu João Paulo



"Para não arrefecerdes, imaginai que podeis vir a saber tudo;
para não presumirdes, refleti que, por muito que souberdes, mui pouco tereis chegado a saber"
Rui Barbosa


Na sexta 06/04, o companheiro João Paulo se filiou ao PCdoB, após décadas de militante e filiado ao Partido dos Trabalhadores, em Pernambuco. Por obra das coincidências, sua decisão, na data limite estabelecida pela legislação para mudanças partidárias, coincidi com a decretação da prisão do companheiro Lula, num processo político que está maculando, de forma indelével, as instituições da República.
Ao longo da sua carreira política, João Paulo foi aprendendo a difícil arte de conquistar o coração e o voto dos eleitores. Primeiro vereador do Partido, depois deputado estadual por 3 mandatos, Prefeito do Recife, reeleito e que ainda conseguiu emplacar seu sucessor, JP, como é conhecido, é um craque na arte da politica, especialmente na relação com os eleitores.
Formado na Juventude Operária Católica, João foi dirigente do Sindicato dos Metalúrgicos e presidente da CUT em Pernambuco. De fala tranquila, não hesitou em dar enfrentamentos quando estava em jogo a defesa do povo. Sua coragem quase lhe custou a vida, no episódio ocorrido em Sítio Grande, na Imbiribeira, quando máquinas do governo e a policia vinham com a ordem de derrubar as moradias das pessoas que há décadas residiam no lugar, para entregar a área para a especulação imobiliária. Foi duramente agredido, tendo suas costelas quebradas e um pulmão perfurado.
Prefeito do Recife, terminou seu segundo mandato com expressiva aprovação, mais de 80%. Após sua gestão como Prefeito, viveu um momento turbulento nas relações com o Partido e suas lideranças, especialmente o então Prefeito João da Costa. Esses episódios, porém, não abalaram a confiança da população que, em 2010, o elegeu Deputado Federal, com uma esmagadora votação de mais de 250 mil votos, dos quais 150 mil só em Recife.
Ainda durante o mandato de Deputado Federal, aceitou a incumbência de reforçar a chapa majoritária do PT à Prefeitura do Recife em 2012, num momento de profunda crise que vivia o Partido em Pernambuco, disputando como vice-prefeito, numa chapa encabeçada por Humberto Costa.
As adversidades enfrentadas naquela campanha foram apenas o prenúncio de outras que viriam nas eleições seguintes. Em todas elas administrou com serenidade os resultados negativos, decorrentes das escolhas que fizera, quando trocou um mandato certo de Deputado Federal para contribuir na chapa majoritária, como candidato ao Senado em 2014 e, em 2016, quando aceitou ser candidato a Prefeito pelo Partido, mesmo tendo sido indicado para tal disputa hã apenas 100 dias da eleição, num ambiente de profunda adversidade que o PT em nível nacional, vinha e vem enfrentando desde aquela época, a partir do impeachment de Dilma, ocorrido naquele mesmo ano,
Com toda essa folha de serviços prestados, João não se sentia confortável pela forma desatenta como era tratado. Afinal, na arte de conquistar o coração dos eleitores, ele é um craque. E muitos no partido nunca entenderam que craques são assim, têm lá suas peculiaridades, mas quando em campo fazem toda a diferença.
Lembo-me que uma fala numa das plenárias do PT, no começo da crise do segundo governo Dilma, ainda em 2015, quando se ensaiavam acusações contra Lula, e alguém sai com essa pérola: É, mas a seleção não sobreviveu sem Pelé? Penso cá com meus botões, com Pelé, em 12 anos conquistou 3 títulos, depois de Pelé, para conquistar o próximo título esperou 24 anos, quando apareceu Romário.
As pessoas podem ter lá suas críticas, mas craques são pessoas que fazem a diferença na vida. Hoje o PT perdeu um craque na arte de conquistar o voto e ocupar espaços nas instituições para tentar mudar seu caráter e sua cultura. E isso é o que pode fazer toda a diferença. Tivéssemos mais companheiros do nosso lado na Câmara e o impeachment de Dilma não teria passado e, por certo, poderia ter mudado a história que o Brasil vive hoje.
Por isso os Partidos, assim como qualquer outro coletivo, devem procurar preservar seus craques.
Aos que foram para as redes sociais gritar “Fora João Paulo”, pronto, ele agora está fora. Aos que o julgaram ultrapassado, ele não será mais problema do PT. Aos que, presunçosamente, mesmo sem ter experimentado tocar o coração do povo e conquistar seu voto, se acham sabedores o suficiente desses caminhos, sugiro dar uma lida na epígrafe desse texto, e refletir sobre os ensinamentos de Rui Barbosa.
Aos que como eu, conviveram com João Paulo todo esse período, ficam as boas lembranças das lutas que juntos travamos e o desejo de que tenha sucesso na nova empreitada, porque o PT pode ter perdido um grande companheiro, mas temos a certeza, por esses anos de convivência, que a luta pelo socialismo não o perdeu.



Hercílio Maciel
Abril de 2018

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