sábado, 15 de setembro de 2018

(Porque) O colapso americano está chegando a um país próximo a você.

 Porque o fascismo está crescendo ao redor do mundo, e como podemos pará-lo

umair haque

Tradução livre Hercílio Maciel 

Um amigo disse no twitter, na última noite “Entendo o ponto de vista de Umair sobre a América. Porém não consigo entender porque a Europa não está sendo acometida pelo colapso americano também.
Você pode pensar, lendo recentes ensaios, que eu suponho que a Europa (Canadá, Ásia, qualquer outro) está imune ao que os Estados Unidos estão passando. Desculpe-me se lhe dei essa impressão. Ninguém está imune. De modo algum. Tenho falado longamente que o fascismo pode ser definidor das nossas vidas adultas – globalmente. E, certamente, ainda o vemos crescendo na Europa. Assim a sombria realidade é algo mais parecido com isso. O colapso americano pode muito bem chegar a um país próximo a você – independente do quão sofisticado, gentil ou sensato seja.
Porém eu quero realmente entender porque, eu não quero palavras que te toquem – assim estou indo começar do início. 
Vamos pensa sobre os Estados Unidos, e a lição que aprendemos para o momento. Se formos honestos, um estado apartheid até 1971. Isto significa, obviamente, que enquanto os países europeus estavam construindo bens públicos – serviços de saúde, aposentadorias, redes de seguridade, etc o qual começou em 1920 em alguns lugares e em 1950 em outros – a América não podia. Porque esses bens ou são para todos ou não são para ninguém. Assim sendo, o preço de ser um estado apartheid é também uma falha para desenvolver grandes sistemas de bens públicos, os quais são a chave para realmente assegurar prosperidade – muito mais que o desenvolvimento de inovações e crescimento (você pode comer um iPhone? Pode tratar um câncer no Facebook?)
O presente da genuína igualdade, em outras palavras, é o povo poder investir uns nos outros em vez de explorar uns aos outros. Esta é a grande lição do século 20 – e infelizmente, é ainda desaprendida. Somente a Europa entendeu isso – e mesmo assim muito pouco e muito raramente.
Os Estados Unidos é o primeiro a cair no fascismo porque teve poucas décadas para aplicar a grande lição do século XX – somente a verdadeira igualdade torna a modernidade possível. Tem, talvez, trinta e poucos anos tentando ser uma sociedade genuinamente moderna e civilizada. O que significa pessoas investindo seus excedentes uns nos outros, através de bens públicos, o que eles só podem fazer se são verdadeiramente iguais. A civilização só estava dentro do reino da possibilidade nos Estados Unidos a partir de 1980 até próximo a 2010 – diferente da Europa. Isto é a grande maldição da América que os americanos ainda não entenderam.
O que aconteceu próximo a 2010? A austeridade começou. Alguns bens públicos começaram a ser cortados enquanto os bancos eram socorridos em massa. O resultado é que uma nova espécie de pobreza explodiu na América – precariedade. As pessoas começaram a viver no limite da sobrevivência, a cada dia, até hoje, proximamente cada um – 80% das pessoas – vive da mão pra boca. Isto que muitos viveram também na Inglaterra Vitoriana. Em outras palavras, os Estados Unidos regressaram um século em apenas uma década. 
Porque os Estados Unidos é assim vulnerável ao fascismo? Porque 30 anos não é um longo tempo, não é? Americanos ficaram pobres de repente, porque nunca tinham sido ricos. Eles tiveram 30 anos para tentar acumular poupança, renda e ativos – porém isso não foi suficiente, especialmente numa sociedade sem bens públicos, onde você está pagando pelos cuidados com a saúde, para realmente construir muita coisa. E a classe média implodiu facilmente, rapidamente e catastroficamente.
O que fez a classe média implodida? Tornaram-se fascistas. Transformaram o luto em injustiça, culpando bodes expiatórios por seus sofrimentos. Fascistas prometem aos que sofreram mobilidade para baixo que eles serão grandes novamente – que eles crescerão culturalmente e triunfarão socialmente, um renascimento simbólico e economicamente renovado. É um apelo poderoso para pessoas que, rapidamente, ficaram em choque, que caíram fora do que aparentava ser um lindo céu azul. Quem irá salvá-las? Quem irá resgatá-las? Para entender o fascismo tem que entender que a mente desse grande estrato da sociedade simplesmente parou de trabalhar. Estas mentes transbordam de mágoas, odeiam inimigos imaginários que os estão perseguindo, vitimando-os e os fazendo sofrer na sua não existência e que precisam destruí-los primeiro, exterminá-los – não é algo que se pareça com pensamento coerente, razão lógica ou sanidade moral.
Deixe-me ligar todos esses pontos, porque eles são sutis. 1971 – o fim da segregação. 2010 – o começo da austeridade. Entre eles apenas 30 anos sendo uma sociedade próspera e moderna. Isto não deu às pessoas tempo suficiente para poupar, investir e acumular suficiente para protegê-las da pobreza. A classe média implodiu como os bancos foram socorridos e a economia entrou em reversão. Empurradas para baixo, despedaçadas, virou fascista por salvação. Você vê como tudo isso se encaixa?
Agora vamos para a Europa. O que a Europa tem que os Estados Unidos não têm? Eles têm um longo período sendo um conjunto moderno e civilizado de sociedades. Lá, grandes bens públicos – cuidados com a saúde, educação, aposentadoria e assim por diante – foram construídos ao longo do século 20. Assim, os europeus têm algo entre 70 e 100 anos sendo modernos, onde os americanos têm meros 30 anos. 
Com isso a Europa foi bem-sucedida, tornando-se moderna. Realmente, a grande construção de bens públicos – o que a América nunca fez, só parcialmente porque não teve tempo suficiente.Estes bens públicos têm tornado os europeus mais seguros. Eles têm altas rendas, mais propriedades de casas, mais poupanças, e assim por diante. Novamente a lição: verdadeira igualdade, real prosperidade. 
Todas essas coisas dá à Europa uma rede de segurança contra o fascismo. Mas eles não estão protegidos absolutamente ou protegidos para sempre.
O problema é que nesse momento a renda está estagnada em todo o mundo – incluso a Europa. Dai o fato de estarmos assistindo por lá o fascismo crescer em, digamos, Itália, Grécia inclusive na Suécia.
Americanos não têm rede de proteção contra o fascismo qualquer que seja. Trinta anos de modernidade, com meros 30 anos para construir alguns bens públicos e o crash. Bang! O cidadão médio sentiu em pleno século 21 a pobreza a partir de 2010. O uivo do fascismo surgiu apenas 5 anos após. 
Europeus têm uma poderosa rede de salvaguardas. Setenta anos de modernidade possibilitou a construção de robustos bens públicos. Alta poupança, renda e mais posses. Porém o crash chegou até eles também. O cidadão médio de lá sentiu que também caiu na pobreza do século 21. Ele tende ficar inalterado – mas está se tornando difícil fazer face às despesas, graças à austeridade, ao neoliberalismo, monopólio e assim por diante. Bang! Eles estão migrando para o fascismo também do mesmo modo que os Estados Unidos. A Alemanha deprimida fácil, a Suécia industrial, a deprimida Grécia. O cinto de ferrugem da América quebrada. Você vê a ligação?
A pergunta é esta. Quanto tempo dura a rede de proteção da Europa? Quanta proteção os europeus realmente têm? Pense o fascismo como um tubarão ou um dragão, corroendo essa rede. Ela não durará para sempre. 
Minha estimativa é que os europeus têm 5 anos de proteção, comparado a América. É apenas uma estimativa – da mesma maneira que um médico estima quanto tempo você tem de vida com um câncer. É muito subjetivo – ainda, algumas poucas pessoas previram fascismo na América, e eu fui uma delas. Assim, 5 anos – mas não de agora, a partir do começo do fascismo americano, o qual começou há 2 anos.
Por isto é que já está sendo visto o fascismo europeu crescendo tão forte e violentamente. A rede de proteção que a Europa tem contra o fascismo está sendo corroída. A estagnação está devorando a seguridade e a segurança europeia. A classe média, em alguns lugares, está movendo-se para baixo – ou menos aspirações estão se transformando em esperanças frustradas.
Uma das grandes vantagens que a Europa tem em relação aos Estados Unidos é que – para ser franco – não se orgulha da ignorância. Assim os europeus podem entender tudo isso, uma vez que lhes seja explicado – diferente dos americanos, os quais, não importa quantas vezes alguém tente explicar, não ouvem, não querem ouvir e podendo ouvir não conseguem entender. 
A Europa não é tão insensata quanto os Estados Unidos e tem pensado nisso antes. A questão, entretanto, é esta. Pode a Europa fazer crescer o investimento em si mesma? Ela pode investir em coisas corretas, sábias e decentes? Pode investir, exatamente como fez nos últimos setenta anos, porém melhor, mais forte e mais robusta e de forma mais ampla, em profundos bens públicos? O qual dá às pessoas o pleno sentido da verdadeira proteção e segurança - econômica, a qual se torna social, psicológica, cultural – que elas não devem migrar para o fascismo para amenizar medos que se tornam paranoicos, delirantes, exagerado nas queixas - tão grandes e ameaçadoras, imaginadas por serem tão perigosas, tornam-se grandes complexos de perseguição psicológica, que deixam as pessoas incapazes de pensar ou raciocinar, apenas capazes de odiar e destruir, como na América, aquela terra de loucura, ganância e ignorância?
Se não puder, é muito simples. O colapso americano está chegando a um país próximo a você.

Umair
Agosto 2018
Tradução livre: Hercílio Maciel
Setembro 2018

Artigo original

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